sexta-feira, 12 de junho de 2015
Abraço (soneto)
ABRAÇO
Se entre Gaio e Gaia, ou o Sim e o Sim,
Seja o abraço meu co'o teu perene,
Atado ante altar o mais solene
Do meu amor por ti, do teu por mim.
Se na ventura de não ter-te o Não,
Meu coração ao teu devote tanto
Silêncio e olhar e voz e grito e canto,
Que o verso seja um verso só, então.
Tuas pedras e mi'as pedras — num só nome!
Compartidas num fado, à mesma mesa,
A gratidão e a angústia, o riso e a fome,
E pronto ao sangue, ao aço e ao perigo,
Sempre seja meu gládio em tua defesa,
Sempre teu abraço seja o meu abrigo.
(G. M. Brasilino)
Se entre Gaio e Gaia, ou o Sim e o Sim,
Seja o abraço meu co'o teu perene,
Atado ante altar o mais solene
Do meu amor por ti, do teu por mim.
Se na ventura de não ter-te o Não,
Meu coração ao teu devote tanto
Silêncio e olhar e voz e grito e canto,
Que o verso seja um verso só, então.
Tuas pedras e mi'as pedras — num só nome!
Compartidas num fado, à mesma mesa,
A gratidão e a angústia, o riso e a fome,
E pronto ao sangue, ao aço e ao perigo,
Sempre seja meu gládio em tua defesa,
Sempre teu abraço seja o meu abrigo.
(G. M. Brasilino)
segunda-feira, 8 de dezembro de 2014
O CONTRÁRIO
O CONTRÁRIO
Do que se me acha escrito em bestiário,
Só vejo u'a sombra, um eco, um 'squecimento
Do que teria sido, se não fosse
Antes o seu escárnio e o seu contrário.
No que se me refaz o cosmo vário,
Mui mais se me desfaz o meu momento,
Que apaga e se me apaga o que, de doce,
Se faz no férreo escarro, o seu contrário.
(G. M. Brasilino)
Do que se me acha escrito em bestiário,
Só vejo u'a sombra, um eco, um 'squecimento
Do que teria sido, se não fosse
Antes o seu escárnio e o seu contrário.
No que se me refaz o cosmo vário,
Mui mais se me desfaz o meu momento,
Que apaga e se me apaga o que, de doce,
Se faz no férreo escarro, o seu contrário.
(G. M. Brasilino)
quarta-feira, 18 de junho de 2014
CAMINHOS DO ASSOMBRO (I)
Caminhos do Assombro
I
O que se há por defesa quando mostra
A face humana mais que face humana?
Quais das misérias da alma nos permitem
Fazer da sarça ardente em farsa ardente?
Pois que debaixo da sombra divina
— Porquanto o que de sombra e de desvelo
Lá se acha, tenho eu cá de sombra e dor —
Tudo é revelação e tudo é assombro.
Não era e então já é, assim resplende
Uma face nova em fenecendo a antiga,
Que furta-me a clareza da ignorância
E deixa para trás só o meu assombro.
Poucas palavras bastam e muitas não
Dirão tudo que ali se mostra e oculta.
Ingente, nasce um nome como as arras
de quiçá um dia agarrar-lhe o interior.
Que nome lhe batiza e lhe consagra,
E em que altar se lhe imola em tinto humor?
E sob que sacerdócio se provê
Seu epitáfio e seu sepultamento?
E gramática qual — ela é atéia —
Permite que novas mentiras jurem
Por verdades arcaicas o que ali
Se mostra sem palavras e entre tantas?
Mas abre-se ante a mim, muito diverso
E todo semelhante, o desespero,
O que não é senão o filho espúrio
Do meu esquecimento e desse assombro;
Do assombro dos momentos em se abre
E se desata, sem que esforço eu faça,
O nó que une ao tanto que confunde
os fios do meu já-ser e meu não-inda;
Mas do esquecimento com que esqueço
Dos fios que se ligam e só recordo
Da confusão que os liga e que os desliga.
(G. M. Brasilino)
I
O que se há por defesa quando mostra
A face humana mais que face humana?
Quais das misérias da alma nos permitem
Fazer da sarça ardente em farsa ardente?
Pois que debaixo da sombra divina
— Porquanto o que de sombra e de desvelo
Lá se acha, tenho eu cá de sombra e dor —
Tudo é revelação e tudo é assombro.
Não era e então já é, assim resplende
Uma face nova em fenecendo a antiga,
Que furta-me a clareza da ignorância
E deixa para trás só o meu assombro.
Poucas palavras bastam e muitas não
Dirão tudo que ali se mostra e oculta.
Ingente, nasce um nome como as arras
de quiçá um dia agarrar-lhe o interior.
Que nome lhe batiza e lhe consagra,
E em que altar se lhe imola em tinto humor?
E sob que sacerdócio se provê
Seu epitáfio e seu sepultamento?
E gramática qual — ela é atéia —
Permite que novas mentiras jurem
Por verdades arcaicas o que ali
Se mostra sem palavras e entre tantas?
Mas abre-se ante a mim, muito diverso
E todo semelhante, o desespero,
O que não é senão o filho espúrio
Do meu esquecimento e desse assombro;
Do assombro dos momentos em se abre
E se desata, sem que esforço eu faça,
O nó que une ao tanto que confunde
os fios do meu já-ser e meu não-inda;
Mas do esquecimento com que esqueço
Dos fios que se ligam e só recordo
Da confusão que os liga e que os desliga.
(G. M. Brasilino)
quinta-feira, 5 de junho de 2014
UM SONETO
Um dia e outro dia e outro após,
E as efemérides e as conjunções
De causas que surpassam às ações,
Fazem com que eu e tu sejamos nós.
Jamais te encontraria se os meus dias
Não fossem aos teus dias tão iguais,
Se as horas que envilecem a nós, mortais,
Não atassem, u'a à outra, fugidias
Almas que em vendo vêem-se imortais,
Que não se vêem se não vêem-se tais,
Que vêem-se juntas quando se vêem sós,
Não nascessem e tornassem a nascer
Um dia e outro dia e outro após.
(G. M. Brasilino)
E as efemérides e as conjunções
De causas que surpassam às ações,
Fazem com que eu e tu sejamos nós.
Jamais te encontraria se os meus dias
Não fossem aos teus dias tão iguais,
Se as horas que envilecem a nós, mortais,
Não atassem, u'a à outra, fugidias
Almas que em vendo vêem-se imortais,
Que não se vêem se não vêem-se tais,
Que reconhecem sem se jamais ver,
Que vêem-se juntas quando se vêem sós,
Não nascessem e tornassem a nascer
Um dia e outro dia e outro após.
(G. M. Brasilino)
sexta-feira, 16 de maio de 2014
Ceticismo
Em "L'Être et les êtres" (O Ser e os seres, ou O Ser e os entes), Maurice Blondel conta uma história interessante:
Quando criança, ele tinha uma gaiola com lagartas, que criava com o propósito de ver as borboletas. Mas um homem bastante rústico (e bastante cético), que não entendia como lagartas podiam se tornar borboletas, decidiu tomar uma lagarta e colocá-la em uma caixa, com água, folhas e grãos de trigo.
Resultado: a lagarta morreu. Ceticismo é incompatível com borboletas. Tudo deve ser conhecido na forma como se dá a conhecer.
Quando criança, ele tinha uma gaiola com lagartas, que criava com o propósito de ver as borboletas. Mas um homem bastante rústico (e bastante cético), que não entendia como lagartas podiam se tornar borboletas, decidiu tomar uma lagarta e colocá-la em uma caixa, com água, folhas e grãos de trigo.
Resultado: a lagarta morreu. Ceticismo é incompatível com borboletas. Tudo deve ser conhecido na forma como se dá a conhecer.
quinta-feira, 24 de abril de 2014
ANDORINHA
ANDORINHA
Andorinha, andorinha,
Onde anda o meu amor?
Diz! Encontra ou advinha,
Ouve a voz de algum rumor,
e então contar-me vem!
Sabe logo ou sabe bem!
Andorinha, andorinha,
Vai buscar o meu amor!
Onde vive o bem que eu tinha?
Lá? Nenhures? Por favor!
Se não trazes minha paz,
Sua lembrança, ao menos, traz!
Andorinha, andorinha,
Diz-me então que tu já a viste!
Andorinha, andorinha,
Pois sem ela eu canto triste!
E responde-me com um chiste:
"Minha cantiga é feliz!"
Andorinha, andorinha,
Todos te pedem o mesmo,
Mas o mesmo que te pedem
Não é mesmo igual ao meu.
(G. M. Brasilino)
Andorinha, andorinha,
Onde anda o meu amor?
Diz! Encontra ou advinha,
Ouve a voz de algum rumor,
e então contar-me vem!
Sabe logo ou sabe bem!
Andorinha, andorinha,
Vai buscar o meu amor!
Onde vive o bem que eu tinha?
Lá? Nenhures? Por favor!
Se não trazes minha paz,
Sua lembrança, ao menos, traz!
Andorinha, andorinha,
Diz-me então que tu já a viste!
Andorinha, andorinha,
Pois sem ela eu canto triste!
E responde-me com um chiste:
"Minha cantiga é feliz!"
Andorinha, andorinha,
Todos te pedem o mesmo,
Mas o mesmo que te pedem
Não é mesmo igual ao meu.
(G. M. Brasilino)
quarta-feira, 30 de outubro de 2013
LEMBRANÇA
O Homem é o que faz de sua lembrança,
matéria viva e informe e fantasmal
na qual, se por discórdia ou se aliança,
sua natureza engendra e, afinal,
o mesmo rio no curso e na nascente
percebe, diga-o bem ou diga-o mal.
Se é chão, montanha a céus sempre ascendente,
Se é chão, que traga e abraça, movediço,
é chão. Se é como fogo, que é serpente,
que de forjar verdades tem feitiço,
é inferno, é morte, é caos, é destruição,
é luz, é força, é espírito, é serviço,
forja também verdades, mas que são.
De além da imprecação e do esconjuro,
das lembranças que logo o deixarão,
não o deixará a lembrança do futuro.
(G. M. Brasilino)
matéria viva e informe e fantasmal
na qual, se por discórdia ou se aliança,
sua natureza engendra e, afinal,
o mesmo rio no curso e na nascente
percebe, diga-o bem ou diga-o mal.
Se é chão, montanha a céus sempre ascendente,
Se é chão, que traga e abraça, movediço,
é chão. Se é como fogo, que é serpente,
que de forjar verdades tem feitiço,
é inferno, é morte, é caos, é destruição,
é luz, é força, é espírito, é serviço,
forja também verdades, mas que são.
De além da imprecação e do esconjuro,
das lembranças que logo o deixarão,
não o deixará a lembrança do futuro.
(G. M. Brasilino)
domingo, 20 de outubro de 2013
BALADA DOS TRÊS AMORES
BALADA DOS TRÊS AMORES
Em terra e céus, na imensidão mais vasta,
Amor a tudo toca e simboliza,
Que de imaginações se faz ou gasta,
Que cria para si qual por si visa.
Amor, que não se cala, e nada basta,
E cuja voz é qual clangor e brado,
Que aos seus e terra move, e a tudo arrasta:
O amar em que o amar se quer amado.
E se de dores, de lamentação,
Cercado vê-se o Amor, como não raro,
Jamais se encontrará na multidão
Como se encontra o Amor no que lhe é caro,
Em quem o sim é sim e o não é não,
E num mesmo horizonte, lado a lado,
Faz-se toda intensão uma intenção.
O amor em que o que ama é como o amado.
Amor, a mais difícil e verdadeira
Vocação e chamado transcendente,
Em que alma espedaçada faz-se inteira.
Então contempla e acha e vê e sente
Que só o Amor é real, que à sua maneira
Exige tudo a quem já tem legado,
No encontro à coisa Última e à Primeira:
No amar em que me faço o ser amado.
ENVOI
A ti, Verdade, a balada se canta.
A ti, Querer, o canto aqui entoado.
A ti, Rever, então, no que me encanta.
A ti, Saudade, em quem me rendo amado.
(G. M. Brasilino)
Em terra e céus, na imensidão mais vasta,
Amor a tudo toca e simboliza,
Que de imaginações se faz ou gasta,
Que cria para si qual por si visa.
Amor, que não se cala, e nada basta,
E cuja voz é qual clangor e brado,
Que aos seus e terra move, e a tudo arrasta:
O amar em que o amar se quer amado.
E se de dores, de lamentação,
Cercado vê-se o Amor, como não raro,
Jamais se encontrará na multidão
Como se encontra o Amor no que lhe é caro,
Em quem o sim é sim e o não é não,
E num mesmo horizonte, lado a lado,
Faz-se toda intensão uma intenção.
O amor em que o que ama é como o amado.
Amor, a mais difícil e verdadeira
Vocação e chamado transcendente,
Em que alma espedaçada faz-se inteira.
Então contempla e acha e vê e sente
Que só o Amor é real, que à sua maneira
Exige tudo a quem já tem legado,
No encontro à coisa Última e à Primeira:
No amar em que me faço o ser amado.
ENVOI
A ti, Verdade, a balada se canta.
A ti, Querer, o canto aqui entoado.
A ti, Rever, então, no que me encanta.
A ti, Saudade, em quem me rendo amado.
(G. M. Brasilino)
domingo, 6 de outubro de 2013
MIDWAY BACK (ode)
MIDWAY BACK
'Twas owl-light. He did decide
to return, went on to pray,
but could not find where to abide
on the way.
Now the old known road was strange.
Once so colourful, now grey.
How did come so fearsome change
in a day?
Once so colourful, now rack.
Full of angels, now dismay.
Would it lead him all way back
or astray?
In the middle he found hope,
when he heard a yell to say
something great and it was "Go!"
Would he stay?
He lacked answers and their lack
he deplored but threw away.
Midway forward, midway back,
that's midway.
He was lone, but not alone.
He saw lots of eyes at bay.
Some eyes would just sway his bone,
some allay.
For that lone one it was cold.
Almost blind, but still not prey.
He could still hear chants of old.
'Twas Lord's Day.
(G. M. Brasilino)
'Twas owl-light. He did decide
to return, went on to pray,
but could not find where to abide
on the way.
Now the old known road was strange.
Once so colourful, now grey.
How did come so fearsome change
in a day?
Once so colourful, now rack.
Full of angels, now dismay.
Would it lead him all way back
or astray?
In the middle he found hope,
when he heard a yell to say
something great and it was "Go!"
Would he stay?
He lacked answers and their lack
he deplored but threw away.
Midway forward, midway back,
that's midway.
He was lone, but not alone.
He saw lots of eyes at bay.
Some eyes would just sway his bone,
some allay.
For that lone one it was cold.
Almost blind, but still not prey.
He could still hear chants of old.
'Twas Lord's Day.
(G. M. Brasilino)
terça-feira, 1 de outubro de 2013
HERANÇA (soneto)
HERANÇA
Imagens que se vivem tais e quais
as margens que estão longe e já beijei-as,
as riquezas perdidas que a mancheias
ateias fogo, ó Tempo, e acendes mais.
Herança, quanto irmana desirmana,
que perde o que já a toma, que é a Herança
que p'ra si traz tudo que de si lança.
Europa que é América e Africana.
É vocação da alma portuguesa,
que evoca-lhe, em segunda natureza,
quanto de Solidão, quão de Verdade.
Que a lusitana nau, camoniana,
promete e profetiza, e em si promana.
Que de mim mesmo brota e a mim me invade.
(G. M. Brasilino)
Imagens que se vivem tais e quais
as margens que estão longe e já beijei-as,
as riquezas perdidas que a mancheias
ateias fogo, ó Tempo, e acendes mais.
Herança, quanto irmana desirmana,
que perde o que já a toma, que é a Herança
que p'ra si traz tudo que de si lança.
Europa que é América e Africana.
É vocação da alma portuguesa,
que evoca-lhe, em segunda natureza,
quanto de Solidão, quão de Verdade.
Que a lusitana nau, camoniana,
promete e profetiza, e em si promana.
Que de mim mesmo brota e a mim me invade.
(G. M. Brasilino)
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